Sucessão rural: o futuro da propriedade em jogo

O tema acima ainda não preocupa e passa longe das porteiras das propriedades rurais de nosso país. Tanto é verdade que nem as lideranças rurais, empreendedores rurais, sindicatos, associações e governo se debruçaram para analisar o assunto em função das conseqüências que a médio e longo prazos trará para a continuidade dos negócios e principalmente para a produção de grãos. Creio que o assunto é muito sério e precisamos discuti-lo de forma mais contundente a fim de encontrarmos saídas eficazes para revertermos esse cenário sombrio que se avizinha.

A exemplo do que ocorre na indústria, comércio e serviços, onde o tema Sucessão tem sido alvo de constante preocupação dos empresários, na passagem do bastão entre uma geração e outra no comando dos negócios familiares, constata-se que essa situação praticamente inexiste no meio rural. É verdade também que o empreendedor rural nunca recebeu informação e capacitação sobre o tema, impedindo-o de dar prioridade sobre o assunto. Necessitamos capacitá-lo adequadamente e dentro de sua linguagem para que o mesmo passe a colocar a Sucessão na pauta de suas atividades diárias e a partir daí, possa discuti-la na família. Precisaríamos ter começado “ontem”, pois já estamos muito atrasados na sensibilização do assunto.

O meio rural brasileiro está ficando somente com as pessoas idosas para produzir alimentos pois os jovens não mais estão ficando na propriedade para “tocar” o negócio dos pais. Preferem imigrar para o meio urbano em busca de “emprego” ao invés de empreender no meio rural e continuar os negócios da família; ser empregados do que donos do seu próprio negócio. É um paradoxo inexplicável, se analisarmos que os filhos já são donos de um negócio e mesmo assim preferem buscar um “emprego” na cidade, embora sabendo que são uma mão de obra sem qualificação para as empresas industriais. Necessitamos encontrar alternativas para fazer o refluxo e principalmente sensibilizar esses jovens de que sua vocação é o manejo da terra. E por que os filhos dos nossos empreendedores rurais não sentem mais o gosto e a motivação para permanecer na propriedade que um dia será deles? Elenco algumas razões que levam e/ou estão levando esses jovens ao êxodo rural, mas que poderia ser diminuído se tivesse sido implantado e gerenciado um programa de Sucessão Rural bem formalizado dentro das propriedades.

· estrutura patriarcal de mando e obediência irrestrita. Não há flexibilidade e negociação entre pais e filhos quanto à melhoria e resultado do negócio;

· baixo nível educacional dos atuais empreendedores rurais (eles não têm culpa) chocando-se diretamente com um melhor conhecimento dos filhos já que os mesmos puderam estudar mais;

· meu avô fazia assim e eu faço igual. Para que mudar? Essa situação impede novos aprendizados e a introdução de novos métodos de trabalho e gerenciamento da propriedade;

· não há um conceito claro de que a propriedade hoje é uma empresa rural e precisa gerar resultado;

· os atuais empreendedores rurais se julgam como trabalhadores rurais e não como empreendedores e/ou empresários;

· fala-se mal do trabalho na terra aos filhos desde que nascem, como se fosse uma doença crônica , influenciando psicologicamente na decisão de ir embora;

· políticas agrícolas dos governos que são feitas em gabinete em desacordo com a realidade do campo e do mercado.

· pouco interesse dos empreendedores rurais em buscar o conhecimento e aplicá-lo na propriedade para torná-la eficiente e produtiva;

· contrariedade em aceitar novas tecnologias que estão sendo introduzidas no meio rural que elevam o aumento da produtividade e a qualidade do produto;

· educação paternalista imposta no meio rural, ou seja, quer-se receber tudo pronto, ao invés de buscar-se alternativas e agregar valor às matérias-primas…

Esses e outros temas devem fazer parte de um programa de sucessão que vise sensibilizar e manter os filhos na propriedade e paralelamente a reciclagem dos pais para que compreendam a nova realidade da empresa rural. Para isto é necessário montar cursos, programas, palestras para enfocar a importância da sucessão rural na perenidade dos negócios e com isso manter os filhos na propriedade.

Não podemos assistir sentados a essa situação, enquanto as propriedades rurais estão sendo tocadas por idosos e aposentados, os quais já não têm mais o pique dos jovens para produzir. Precisamos oxigenar e renovar urgentemente, pois o aumento da produção e da produtividade dependem dessa mudança. Aliás, nossa produção de grãos é baixa se levarmos em conta nossas dimensões territoriais. A meu ver, esse aumento virá, sem dúvida nenhuma, a partir da fixação do jovem no meio rural e de sua capacitação para tornar-se um verdadeiro empresário rural. Convém educá-lo no sentido de que terá em suas mãos uma empresa que necessita ser gerenciada com introdução de ferramentas de gestão modernas para obter Resultado, a exemplo do que ocorre com as empresas do meio urbano. Para que isto aconteça é necessário que todos os membros da família estejam abertos, flexíveis e dispostos a discutir a Sucessão Rural, onde devem ser definidos os papéis de cada um para que o processo seja bem elaborado.

Sabemos que o tema mexe com a estrutura de poder, com as emoções dos envolvidos, mas que precisa ser administrada de forma profissional para que a passagem do comando dos negócios seja feita com tranqüilidade e não deixe seqüelas. A empresa rural precisa viver, gerar emprego, renda e resultado para que possam ser feitos os investimentos necessários e com isso as futuras gerações continuarão o trabalho. Precisamos criar a perspectiva de que o jovem tem um negócio na mão e só dependerá do trabalho dele para conseguir o sucesso. Essa motivação precisa acontecer, pois somente assim ele poderá profissionalizar o negócio, buscar parcerias, desenvolver novos produtos, gerando, com isso, resultados a todos os envolvidos. Sensibilizar o tema da sucessão rural, junto às propriedades é, a meu ver, o maior desafio. Vamos começar a discuti-lo, pois o futuro da propriedade passa sem dúvida nenhuma por isso. Desta forma estaremos garantindo a produção de alimentos, caso contrário, encontraremos apenas as placas de “vende-se” nas propriedades. Quem ganha e quem perde com isso? Acredito que a perda será de toda a sociedade.

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1 de fevereiro de 2020 08:39

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